A ti, minha mãe, amiga e companheira,
Que tens a alma grávida da esperança,
Dedico estes versos que escrevi,
Lembrando do meu tempo de criança,
Quando tua voz misturava-se com as dos pássaros
E com ternura embalavas o meu corpo
Com canções e poéticas fantasias.
Eram fadas, carneirinhos e estrelas,
Que desfilavam e comigo conversavam
Na transparência infinita dos meus sonhos.
Tuas mãos me envolviam com os carinhos
Que reservados ficaram para os outros corpos
Que de ti haveriam de nascer.
Tinhas como confidentes os sabiás,
Patativas, rouxinóis, lavandeiras e bem-te-vis,
Que saltitavam sobre o arvoredo.
De repente caía o véu da noite
E o silêncio envolvia os bosques.
Na casa antiga de alpendre
Transmitias paz a alegria
Aos que que contigo dividiam
O fardo do trabalho dia a dia
E ouviam, atentamente, tuas estórias.
Hoje, no crepúsculo da existência,
Te dedico estes versos que escrevi,
Lembrando do meu tempo de criança.
Eles vieram em plena madrugada,
Embalados pela musa despertada.
Me encontraram sem fantasias e canções,
Mas com lágrimas sem ternura
Para molhar as pedras da razão
E colorir de pétalas azuladas
Os espaços desertos do meu peito.
Em companhia da insônia me levanto
E paro na janela frente ao mar
E o pensamento vai subindo devagar
Até perder-se no mistério do infinito
Para contemplar estrelas no céu
Que se confundem com estrelas no mar.
O silêncio me envolve no manto da saudade
Do tempo da minha infância.
Sinto a vontade de ser outra vez criança
E trazer-te presente na lembrança
Para brincarmos nas noites de insônia.