IECLB e Igreja Católica Apostólica Romana


- Brasil
ID: 2723

Relatório de Malta - Apresentação

Comissão Mista Nacional Católico-Luterana

Apresentação

Apresentamos o Relatório de Malta, resultado do diálogo teológico entre católicos e luteranos convocados pelo Secretariado para a União dos Cristãos, do Vaticano, e pela Federação Luterana Mundial, de Genebra. Quanto ao seu surgimento o próprio relatório expõe o histórico. Mas ele se insere no contexto amplo do diálogo mundial entre católicos e luteranos. Por esse motivo expomos, nesta apresentação, num primeiro tópico a situação atual, posterior ao Relatório de Malta, do diálogo mundial entre luteranos e católicos. De outra parte, é preciso conscientizarmo-nos sobre o atual relacionamento entre católicos e luteranos no Brasil. Por essa razão o segundo tópico aborda o conceito de ecumenismo da Igreja Católica e da IECLB. No tópico três indicamos o valor que cabe ao Relatório de Malta, e o tópico quatro expõe, sucintamente, as convergências teológicas registradas entre católicos e luteranos. Essa parte, esperamos, servirá tanto de chave para a compreensão do Relatório de Malta como incentivo para uma melhor compreensão mútua em nosso país. 

I. Situação do diálogo mundial católico-luterano 

A Comissão Mista Internacional Católico-Luterana, convocada em 1973 pela Federação Luterana Mundial e pelo Secretariado para a União dos Cristãos (Vaticano), tem como objetivo primordial dar início a uni processo de recepção do Relatório de Malta, em ambas as Igrejas, bem como à avaliação das eventuais respostas a este documento. 

A Comissão tem a tarefa de estimular, em nível internacional, o desenvolvimento das relações entre católicos e luteranos, visando atender às várias iniciativas e tendências que surgem neste campo. 

Na primeira reunião (janeiro 1973, em Genebra), a Comissão propôs se procurasse observar a repercussão do Relatório de Malta nos seguintes pontos: 

  • Que colaboração entre católicos e luteranos é agora possível em nível local? 
  • Quais são as consequências, para a vida comum das Igrejas e para as comunidades de base, dos acordos já concluídos? 
  • Quais os assuntos que necessitam de ulteriores estudos? 
  • De que maneira pode-se progredir, além do Relatório de Malta? 
  • Em que extensão o desenvolvimento do mundo contemporâneo influencia as nossas relações e o nosso futuro? 

No seu segundo encontro (janeiro 1974, em Roma), a Comissão sondou as áreas em que se faz necessária uma futura investigação comum. Em particular, foram focalizadas as diferentes maneiras como os ministérios ordenados em ambas as Igrejas são atualmente organizados bem como a maneira pela qual estas compreendem e celebram a Eucaristia (Santa Ceia).

Para o futuro, a Comissão planeja continuar a estudar as possibilidades de um acordo entre as duas Igrejas, quanto à Eucaristia e, concomitantemente, ocupar-se com o estudo do ministério, especialmente do episcopado. Enquanto este trabalho estiver em andamento, a Comissão receberá e estudará as avaliações do Relatório de Malta que chegarem a ela de Comissões e centros eclesiais, grupos locais ou de teólogos entendidos do assunto.

Adicionalmente, a Comissão Mista Internacional Católico-Luterana continuará atenta aos desafios e às oportunidades específicas que as duas Igrejas possam encontrar no cumprimento da Missão de Cristo no mundo, na esperança de que luteranos e católicos possam, ao enfrentá-los, dar-se apoio mútuo, em escala sempre maior.

A Comissão planejou seu terceiro encontro para 1975, a fim de avaliar as respostas das Igrejas ao Relatório de Malta. À luz destas espera estar em posição de encontrar novos caminhos de colaboração e expressão de uma vida espiritual comum para católicos e luteranos. 

II. Conceito de ecumenismo 

Base indispensável de todo verdadeiro ecumenismo é o reconhecimento mútuo da eclesialidade, quer dizer do fato de as nossas comunidades se sentirem, enquanto comunidades, convocadas por Cristo à sua Igreja. Esse reconhecimento não implica, porém, uma renúncia às próprias concepções eclesiológicas. Eclesialidade é consciência de vocação, mas também certeza da atuação de Cristo e do seu Espírito nas nossas comunidades. Por isso, é necessário reconhecer com alegria e estimar os valores genuinamente cristãos, derivantes de um patrimônio comum, que se encontram entre os irmãos de outras confissões (Concílio Vaticano II, Decr. Unitatis renditegratio, no. 4) , a fim de que todos possam agir e falar em conjunto, tal como a situação concreta o exigir no que diz respeito às tarefas, para as quais Deus chama o seu povo (Conselho Mundial das Igrejas, Fórmula de unidade, de Nova Delhi). A unidade da Igreja não se baseia em obra de união humana, mas no fato de que Cristo, sendo o Cabeça, se fez um como ela, seu Corpo. 

O ecumenismo não pode visar a uma simples fusão organizativa, que ficaria no nível do jurídico. Pelo contrário, ele brota da resposta ao apelo de unidade contido na oração de Cristo ao Pai (Jo 17,21), durante a última Ceia. Por isso, o ecumenismo é um esforço de crescimento mútuo na Palavra de Deus, em confronto com os desafios do nosso tempo. Ë uma caminhada em comum, a fim de que a divisão entre os cristãos não continue a ser um obstáculo à proclamação do Evangelho no mundo. 

A Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil e a Igreja Católica Romana empreenderam consciente e decididamente esse caminho. De acordo com sua Constituição, a IECLB considera-se vinculada pela fé no Senhor da universal, santa e apostólica Igreja, às Igrejas que confessam no inundo Jesus Cristo como Senhor e Salvador (cf. Constituição da IECLB, Art. 29). 

Por sua parte, o Concílio Vaticano II, no Decreto Unitatis redintegratio (no. 4), adverte com gozo que a participação dos fiéis católicos na ação ecumênica cresce cada dia e a recomenda aos bispos de todo o mundo, a fim de que a promovam com diligência e a dirijam prudentemente. n que, como o mesmo documento afirma, aquilo que é verdadeiramente cristão não pode opor-se, de jeito nenhum, aos autênticos bens da fé; antes pelo contrário, pode fazer com que se atinja mais perfeitamente o próprio mistério de Cristo e da Igreja. 

III. Valor do Relatório de Malta 

Quanto ao gênero literário, convém notar que não se trata de um símbolo ou profissão de fé. Mas é um documento redigido por comissões oficialmente encarregadas de elaborar não uma declaração dogmática normativa, e sim uma base comum para o estudo e o diálogo. Sem ser oficial, é de grande importância para melhorar as relações entre as Igrejas, de modo que, de hoje em diante, as lideranças religiosas e as comunidades eclesiais não podem ignorá-lo sem a impressão de não levarem a sério o ecumenismo. 

IV. Convergências teológicas 

A união de nossas igrejas não foi ainda alcançada; nem sequer se encontra à vista. Temos, porém, motivos para alegria e gratidão. Não somente pelo fato de que podemos nos considerar irmãos e saber que somos chamados ao seguimento do mesmo Senhor Jesus Cristo. Mas também no entendimento teológico mútuo houve uma notável mudança positiva. Depois da Reforma houve séculos em que a polêmica mútua se tornou cada vez mais radical, as divergências eram cada vez mais acentuadas e o abismo de separação parecia cada vez mais profundo. Hoje não é assim. Sentimos como o abismo diminui. Encontramos caminhos — difíceis ainda —, que levam de um lado a outro. Em vez de simples divergências registramos sempre mais convergências. Por que não crer que o Espírito Santo esteja atuando? Como não alentar então a esperança de que o presente caminho pode levar à união, mesmo que ainda distante? Não resistamos, pois, ao Espírito e andemos, sem esmorecimento, por esse novo e promissor caminho. 

O Relatório de Malta registra uma série de convergências teológicas que contrastam com as respectivas divergências do passado. Por isso, alegria e gratidão, bem como convite a meditarmos sobre elas e assumirmos as consequências. Damos alguns exemplos. 

Escritura e Tradição. No passado a teologia luterana chegou a falar da autoridade da Escritura como oposta à qualquer tradição ; e a teologia católica, da Tradição como mais plena do que a Escritura. Hoje convergimos na consciência de que há um Evangelho de Jesus Cristo que se encontra testificado na Escritura e que deve ser proclamado aos homens em todos os tempos, pela sua igreja, assim também hoje. 

Justificação e Santificação. A justificação pela graça mediante a fé é doutrina central da Reforma. Às vezes foi apresentada como se fosse uma mera declaração de Deus sem consequências para a pessoa e a vida do crente. De outra parte, a santidade moral tem sido acentuada pela teologia católica, por vezes como se fosse condição para o ato justificante. Hoje há convergência na consciência de que a salvação é dádiva imerecida e incondicional de Deus, mas que por ela somos renovados para vivermos em fé uma vida conforme seu agrado. 

Eucaristia e Palavra. No passado o luterano poderia ter a impressão de que a eucaristia católica tivesse caráter mágico ou repetisse o sacrifício de Cristo, enquanto que o católico poderia ter a impressão de que no culto luterano, pelo destaque da palavra, houvesse uma falta de fé na presença sacramental de Cristo. Hoje convergimos no conhecimento de que Cristo, o Verbo encarnado, se dirige a nós como pessoas integrais, doando-se, chamando-nos à fé, inserindo-nos na comunhão dos irmãos e enviando-nos ao mundo como suas testemunhas.

Igreja. Para a teologia luterana é essencial que a Igreja seja determinada pela Palavra de Deus, mas às vezes chegava-se a afirmar que a Igreja verdadeira é invisível. A teologia católica tem destacado que a Igreja instituída por Cristo possui necessariamente uma instituição e direito divinos, mas às vezes a afirmação da autoridade presente da Igreja chegava a absolver a autoridade da Palavra. Hoje convergimos no conhecimento de que a Palavra está acima da Igreja, mas que a própria Palavra requer Igreja organizada que a transmita. 

Unidade. A convicção da união fundamental que é conferida pela fé em Cristo podia levar luteranos a desclassificar a união exterior da igreja, enquanto que a consciência da necessidade de união institucional podia levar católicos a considerá-la simplesmente idêntica à união em Cristo. Hoje convergimos na convicção de que Cristo é ele próprio o fundamento de nossa união, mas também nos quer unidos em fé, culto, testemunho e vida.

Esses são alguns breves exemplos. Lembramo-nos, por fim, que a causa das divergências tem sido frequentemente uma visão introvertida de cada uma das igrejas, em seu tempo, o que levava a polemizar contra a outra. Hoje nos defrontamos com múltiplos desafios comuns, que nos advêm do mundo. A compreensão do mundo atual favorece uma visão mais realista, formulações comuns da mensagem da salvação e novas estruturas de vida eclesial, dando lugar assim a convergências. Mais do que oportunismo, o encontro é então uma chance de autenticidade. Seja feita a vontade do Pai.

 

Veja: O Evangelho e a Igreja ( O Relatório de Malta)


 


Âmbito: IECLB / Organismo: Igreja Católica Apostólica Romana - ICAR
Natureza do Texto: Manifestação
Perfil do Texto: Ecumene
ID: 20216
Sabemos que todas as coisas trabalham juntas para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles a quem Ele chamou de acordo com o seu plano.
Romanos 8.28
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