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Novo índice de igualdade

10/04/2004

Novo índice de igualdade


Por Marcelo Medeiros
Extraído de www.rits.org.br

Depois dos índices de desenvolvimento humano e juvenil, daqui a pouco pode ser a vez de a igualdade racial no Brasil - e talvez no mundo - ser avaliada. A idéia é da psicóloga Edna Roland, coordenadora da Área de Combate ao Racismo e à Discriminação da Unesco no Brasil. Há algumas semanas, ela apresentou a proposta de criação do Índice de Igualdade Racial na última reunião do Grupo de Experts Eminentes, do qual faz parte. O órgão é responsável por acompanhar a implementação do Programa de Ação de Durban, que busca eliminar todas as formas de preconceito e discriminação racial.

A idéia foi bem recebida e agora Roland busca apoio tanto dentro quanto fora do país para levar adiante o projeto do índice. Para ela, a criação do IDR neste ano seria muito importante, pois é o Ano Internacional de Comemoração das Lutas contra a Escravidão. O Índice de Igualdade Racial deverá se constituir numa ferramenta política e ética: ninguém quer ficar mal na foto, os governos irão se preocupar em expor as desigualdades existentes, diz a brasileira.

Uma das fundadoras do Coletivo de Mulheres Negras e do Instituto Geledés da Mulher Negra, duas entidades bastante ativas no cenário nacional, Roland acha que o racismo no país está diminuindo, mas ainda é muito forte – e isso pode ser notado em qualquer lugar a que se vá. Nesta entrevista ela explica melhor como seria desenvolvido o IIR e fala sobre a força do preconceito racial no Brasil.

Explique no que consistiria o Índice de Igualdade Racial. Que indicadores seriam utilizados e qual seu período de reavaliação? Seria um índice a ser utilizado em todo o mundo ou só no Brasil?

Edna Roland- A proposta do Índice de Igualdade Racial baseou-se no Índice de Desenvolvimento Humano, que é calculado pelo Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) para todos os países que fazem parte da ONU, e na experiência que foi desenvolvida pelo economista Marcelo Paixão e pela pesquisadora Wania Santana de calcular separadamente o IDH de negros e brancos no Brasil, como se fossem dois países diferentes. Para se ter uma idéia, em 2001 o Observatório Afro-Brasileiro, coordenado por Marcelo Paixão, calculou que o IDH dos negros no Brasil era de 0,712 e o dos brancos, 0,820, ficando o Brasil Negro na 107ª posição num total de 175 nações, enquanto o IDH do Brasil branco ocupou a 65ª posição. Assim, imaginei que se poderia desenvolver um índice que justamente classificasse os países pelo grau de desigualdade racial existente na sua população. A operacionalização da proposta deverá ser delineada por um grupo de trabalho envolvendo as diversas agências do sistema ONU, incluindo a Unesco, Pnud, Banco Mundial, OIT, Unctad, FNUAP e o Alto Comissariado de Direitos Humanos. Uma idéia possível é que este índice utilize os mesmos indicadores que compõem o IDH: rendimento per capita, escolaridade (taxa de escolaridade e de alfabetização) e esperança de vida ao nascer. Todavia o cálculo deverá ser feito separadamente para os grupos étnicos/raciais que compõem a população de cada país e deverá ser construída uma escala para medir a desigualdade entre os grupos. A proposta é que este índice seja utilizado para avaliar a desigualdade racial em todos os países, que serão então classificados de acordo com o grau de desigualdade. Quanto à periodicidade, estamos ainda no processo inicial de discussão, mas se a experiência do IDH for seguida, o IIR deverá ser calculado anualmente.

Qual foi a reação à proposta na Unesco?

Edna Roland - A proposta foi apresentada inicialmente em Genebra, em setembro de 2003, na reunião do Grupo de Experts Eminentes, do qual faço parte, encarregado de acompanhar a implementação da Declaração e Programa de Ação de Durban. Ela foi recebida com muito entusiasmo pelos meus colegas da Unesco, tanto do escritório do Brasil quanto da sede, em Paris. A Divisão de Direitos Humanos da sede colocou o desenvolvimento deste índice como uma das suas prioridades para o biênio 2004-2005.

Qual o significado de se criar um Índice de Igualdade Racial neste ano de Comemoração das Lutas Contra a Escravidão?

Edna Roland - Considero que será um grande avanço se conseguirmos desenvolvê-lo este ano. As Nações Unidas declararam 2004 o Ano Internacional de Comemoração das Lutas contra a Escravidão e sua Abolição exatamente para impulsionar iniciativas de combate ao racismo e promoção da igualdade.

De que forma esse índice pode ser utilizado para diminuir a desigualdade brasileira?

Edna Roland - Ao se tornar um índice internacional, aceito e legitimado pelo conjunto das nações, o Índice da Igualdade Racial deverá se constituir numa ferramenta política e ética: ninguém quer ficar mal na foto, os governos irão se preocupar em expor as desigualdades existentes.

Por falar em índices, uma pesquisa publicada no ano passado pela Fundação Perseu Abramo mostrava que a quantidade de pessoas que assume ser racista diminuiu consideravelmente. Em 95, quando foi feita pela primeira vez, com dados do Datafolha, 12% dos entrevistados afirmavam ter preconceito contra negros. Em 2003, apenas 4% fizeram essa declaração. Outro item mostrava, em 1995, que 87% das pessoas diziam haver preconceito indireto, número que caiu para 74% em 2003. É possível sentir essa melhora no cotidiano?

Edna Roland - Hoje se fala mais abertamente no Brasil sobre racismo e discriminação racial, como também houve um avanço significativo na discussão acerca de políticas específicas para a promoção da igualdade racial. A redução nos percentuais pode não significar exatamente que o preconceito tenha diminuído: pode significar que as pessoas tomaram consciência de que ter preconceito é uma coisa grave e passaram a ocultar as suas concepções.

Qual sua opinião sobre o Estatuto da Igualdade Racial?

Edna Roland - O Estatuto da Igualdade Racial é uma iniciativa da maior importância e representa um grande esforço do Poder Legislativo, do qual participaram diversos representantes da sociedade civil. Espero que o Parlamento brasileiro o aprove integralmente neste ano, o Ano Internacional de Comemoração da Luta contra a Escravidão e sua Abolição.

Cotas nas universidades ajudam a promover a igualdade racial?

Edna Roland - Sem dúvida. Além de abrir as portas da universidade para um número significativo de jovens negros e negras, que deverão no futuro ocupar espaço em todos os setores da vida social, o próprio debate sobre as cotas tem obrigado a sociedade brasileira a se repensar. É evidente que o acesso à universidade não resolve todos os problemas enfrentados pela população negra no Brasil. Os opositores costumam dizer que a presença reduzida de negros na universidade é apenas a ponta do iceberg. Sem dúvida! Mas temos que começar por algum lugar: a ponta pode justamente ser o começo! A importância que é dada à universidade justamente abre o caminho para que outros espaços possam também ser democratizados, recebendo uma parcela deste povo que é quase metade do Brasil.


 

Louvem o Senhor pelas coisas maravilhosas que tem feito. Louvem a sua imensa grandeza.
Salmo 150.2
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