Vida Celebrativa - Ano Eclesiástico


ID: 2654

Isaías 44.6-8 - 8° Domingo após Pentecostes - 23/07/2023

Auxílio Homilético

23/07/2023

 

Prédica: Isaías 44.6-8
Leituras: Mateus 13.24-30, 36-43 e Romanos 8.12-25
Autoria: Nilton Giese
Data Litúrgica: 8° Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 23/07/2023
Proclamar Libertação - Volume: XLVII

 

Harmonia na diversidade

1. Introdução

O texto de Isaías 44.6-8 foi analisado no Proclamar Libertação 35 e 38, com boas reflexões de Felipe Gustavo Koch Buttelli e Helga Rodrigues Pfannemüller. Ele e ela trabalham muito bem a proposta de Severino Croatto, que enfatiza que a problemática descrita nesse texto está no binômio idolatria-confiança em Javé. Javé requer a confiança em suas palavras num contexto de sofrimento e desesperança. O povo insiste em confiar nos deuses pagãos, fazendo imagens para cultuar (Is 44.9-20).

Portanto é consenso que o texto trata da questão entre Javé e os outros deuses. Nossa reflexão sobre esse texto quer trazer mais um aspecto para a reflexão: a questão da vivência da fé cristã num contexto plurirreligioso, sem a necessidade de combater nem negar esses outros deuses.

2. Comentários exegéticos

O texto de Segundo Isaías está identificado pelos comentaristas bíblicos como um discurso judiciário, localizado no final do período do exílio na Babilônia, portanto, provavelmente, perto do ano de 540 a. C. Esse tipo de discurso costuma conter, entre outras características, o testemunho dos compromissos assumidos, a recordação de benefícios passados, ameaças ou advertências sobre o descumprimento da aliança ou, como aqui, a reafirmação da validade da aliança e das promessas que a constituem.

As debilidades do Império Babilônico estão cada vez mais evidentes e o Segundo Isaías sabe que o Império Persa, sob a liderança de Ciro, ganha espaço. Segundo Isaías vê Ciro como o Ungido de Deus (cap. 45), apesar de Ciro não ter nada a ver com o judaísmo. Assim como Ciro, Javé também pode utilizar os outros deuses. Portanto o texto não parece querer lutar contra os outros deuses, mas sim demonstrar que Javé se torna superior a todos eles pela sua atuação na história.

Gerhard von Rad, nos seus dois volumes sobre a Teologia do Antigo Testamento, nos ensinou que, no tempo do exílio, o chamado Escrito Sacerdotal desenvolveu uma espiritualidade nova, que deu sustentação a um judaísmo sem o templo de Jerusalém. Questões como a importância de guardar o sábado e o surgimento das sinagogas, onde ao menos se pudesse ler a Torá e entoar salmos de lamentação, ajudaram a preservar uma identidade judaica em terra estrangeira.

Portanto, assim como no Egito, Deus parece estar entrando outra vez na história em favor do seu povo. O enfraquecimento dos governantes babilônicos e a ascensão do Império Persa são interpretados por Segundo Isaías como prenúncio da libertação do exílio. A dívida do exílio foi paga. É tempo do segundo êxodo.

Mas há um grande desafio nesse processo de libertação do exílio. O exílio deixou profundas marcas no povo judeu. E uma dessas marcas diz respeito ao contato intenso com outras religiões e outros deuses. Na Babilônia, os judeus conheceram muitos outros deuses, com mais seguidores que todos os judeus. Esses deuses eram proclamados como mais poderosos que o Deus do povo judeu. Por isso o profeta Isaías destaca, em nosso texto, algumas questões importantes que diferenciam o Deus de Israel dos outros deuses.

Primeiro, a autoapresentação de Javé no início de nosso texto – Eu sou o primeiro e eu sou o último – é um aspecto teológico importante, pois ela faz referência à presença de Deus na história, mesmo antes de Abrão. Deus caminha na história desde o início, desde antes da criação do mundo. Por isso o Escrito Sacerdotal refez toda a leitura da criação (Gn 1.1 – 2.4a) dizendo que aquilo que outros povos chamam de deuses (sol, lua, estrelas), tudo isso são obras do Deus maior. No exílio, eles conviveram com outros deuses e outras religiões, mas Senhor, quem é como tu entre os deuses? (Êx 15.11). Haverá outro que seja igual a mim?, pergunta Deus (Is 44.7). Portanto o texto não se perde negando a existência de outros deuses, mas afirma que confiar neles é errado, porque eles são apenas criaturas do Deus maior.

O segundo aspecto importante vem da mensagem profética de que Deus manifesta, sim, a sua ira contra os pecados das autoridades e do povo, mas que essa ira de Deus passa e ele volta a mostrar sua bondade e sua misericórdia. E o povo no exílio será testemunha disso. O exílio, a escravidão e o sofrimento não foram desejos de Deus. O exílio foi consequência do pecado e da desobediência das autoridades e do povo de Israel. Mas não há outro Deus que seja tão misericordioso a ponto de tomar a iniciativa de perdoar a maldade do seu povo. Não, não há outra Rocha que eu conheça, responde o próprio Deus no final do v. 8. O povo no exílio levou muito tempo para deixar de culpar Deus e reconhecer o exílio como consequência da sua própria maldade. Mas agora esse castigo chegou ao fim.

Portanto, para discernir a fé judaica da fé em outros deuses, o profeta coloca os seguintes critérios de discernimento: 1) Deus é o Criador de todas as coisas, portanto, o que outros povos adoram (sol, lua, estrelas, montanhas), tudo isso são criaturas do Deus maior. Esse Deus maior pode utilizar todos os poderes a seu serviço. Por isso, entrar em conflitos para provar que outros deuses não existem é algo inútil. 2) Deus é um Deus libertador. O sofrimento não é desejo de Deus. Ele é consequência do pecado e da maldade humana. O sofrimento deve nos fazer perguntar pela sua causa. E a causa do sofrimento sempre estará na maldade do ser humano.

Finalmente, Butelli traz ainda um detalhe importante no v. 8d para nossa reflexão: a palavra Sur, que Almeida traduz corretamente por rocha, mas que também tem a conotação de montanha. Ao invés de dizer: Não, não há outra Rocha que eu conheça, a tradução também poderia ser da seguinte maneira: Não há montanha! Não conheço (nenhuma)! Ambas as traduções são possíveis, mas cada uma apresenta uma referência própria de significado. Rocha poderia fazer menção a uma linguagem muito comum dos Salmos, em que Javé é a rocha. Não haveria assim outra rocha que pudesse dar firmeza e salvação. No entanto, quando nos referimos a outros deuses – ou a ídolos –, é possível traduzirmos por montanha, linguagem recorrente em Deuteronômio, quando se fala de outras divindades.

3. Meditação

Profetas falam em nome de Deus, por suas ordens, em seu lugar. Assim também nesta passagem, Segundo Isaías inicia seu discurso com as palavras: Assim diz o Senhor, Rei de Israel, seu Redentor, o Senhor dos Exércitos [...]. Portanto, é Deus quem fala a seu povo. E ele é categórico: Eu sou o primeiro e o último, ou seja, eu estou no início e no fim. Com isso o profeta nos quer dizer que Deus é o Senhor da história e que tudo que existe foi criado por ele.

A partir disso, o texto entra na questão dos deuses ou dos ídolos. O tempo do exílio fez o povo de Israel conhecer muitos outros deuses. Mas o texto do profeta Isaías não parece preocupado em negar a existência desses outros deuses. Assim como Jesus não nega a existência do joio no meio do trigo, nem o apóstolo Paulo nega a existência da natureza humana que nos afasta de Deus. A questão aqui não é negar, mas mostrar a atuação de Deus na diversidade.

Perdemos muito tempo e energias negando ou tentando provar que outros estão errados e que nós somos os corretos. Com isso nos esquecemos que especialmente as questões religiosas não são objeto de verificação ou comprovação racional. Os ídolos existem para quem acredita neles. O texto do profeta quer nos alertar que não vale a pena perder tempo em batalhas contra outros deuses. Quem se dedica a essas batalhas não terá olhos para ver como Deus é capaz de utilizar qualquer coisa para manifestar o seu poder.

Por isso o profeta nos quer chamar muito mais a atenção para o testemunho de nossa fé. Para fortalecer a nossa fé, precisamos melhorar o testemunho da nossa confiança em Deus, precisamos dedicar mais atenção ao testemunho convincente do Evangelho de Jesus Cristo e demonstrar com nossas atitudes o compromisso que temos de viver de acordo com os ensinamentos de Jesus. Nossa confiança em Deus deve dar testemunho de que não há outro fundamento seguro nesta vida, senão aquele Deus que desde o início tem guiado o seu povo e que vai conduzi-lo também no futuro. Nós não precisamos ir na frente de Deus destruindo outros deuses para que Deus possa se manifestar. Mesmo num contexto plurirreligioso, Deus pode utilizar todos os poderes para mostrar que o seu poder é maior.

Na parábola do joio que cresce junto com o trigo, Jesus pede abertura de mente e coração para acolher com esperança (não passivamente, com indiferença) aqueles que nos parecem diferentes. Devemos ter abertura para acolher com uma atitude de pluralismo assimilando a diferença, que sempre vai estar presente em nossa humanidade.

A parábola do joio não ignora a presença do mal na história. Jesus reconhece a presença do mal. Mas Jesus nos chama a atenção para não dividir a humanidade entre bons e maus, oferecendo o prêmio da salvação para os primeiros e a condenação para os segundos. Na maioria das vezes, atitudes assim nos levam a enormes enganos. Somente Deus pode julgar cada ser humano, com sua imensa justiça e misericórdia, como só ele sabe fazer.

4. Subsídios litúrgicos

Oração: Senhor, permite que vivamos como irmãos e irmãs. Que encontremos sempre a harmonia na diversidade. Ajuda-nos a respeitar igrejas e outras religiões, valorizando nelas o que vale a pena conhecer. Que teu Santo Espírito nos conceda a tua santa paz e que o teu amor seja sempre mais forte que nós. Amém.

Bibliografia

BUTELLI, Felipe Gustavo. Auxílio homilético para Isaías 44.6-8. Proclamar Libertação. São Leopoldo: Sinodal; EST, 2011. v. 35. Disponível em: <www.luteranos.com.br>.
PFANNEMÜLLER, Helga Rodrigues. Auxílio homilético para Isaías 44.6-8. Proclamar Libertação. São Leopoldo: Sinodal; EST, 2014. v. 38. Disponível em: <www.luteranos.com.br>.
RAD, Gerhard von. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: ASTE, 1973. v. 1 e 2.


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Autor(a): Nilton Giese
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo do Tempo Comum
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 8º Domingo após Pentecostes
Testamento: Antigo / Livro: Isaías / Capitulo: 44 / Versículo Inicial: 6 / Versículo Final: 8
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2022 / Volume: 47
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 69509

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