IECLB e Igreja Evangélica Luterana na Baviera - Alemanha



ID: 2712

Extratos de Carta do Pastor Otto Kuhr para Julia Kuhr nasc. Lettow, sua mãe

01/12/2013

Extratos de Carta do Pastor Otto Kuhr para Julia Kuhr nasc. Lettow, sua mãe

Primeiras impressões da Comunidade de Estrada da Ilha

 

Estrada da Ilha, Santa Catarina, 28 de janeiro de 1898.

Querida mamãe e irmãos!

Vocês nem podem imaginar quanta alegria senti ao receber as primeiras cartas em solo brasileiro, a saber, a tua, querida mãe, a dos queridos tio e tia e a de Anna, da América. Tua carta levou 28 dias até chegar, a segunda - de Rothenburg - levou 32 dias e a da América 38 dias. Todas elas me trouxeram muita alegria.

De Anna recebi boas notícias. Ela e os filhos passam bem, graças a Deus. Eu já estava bem preocupado, porque desde 28 de outubro não havia recebido nenhum sinal de vida deles. Anna agora tem tanta coragem, que quer vir apenas no outono para cá junto com o irmão Fritz, que a acompanhará. Eu escrevi a ela que, em princípio, ela poderia vir logo. Pois os temidos perigos daqui, em verdade, só existem nas cabeças das pessoas...

Mas vamos ao que interessa: Vocês, meus queridos e minhas queridas, certamente querem saber como estou passando, aonde, afinal, eu me enfiei, e quantas cobras, ursos, panteras ou outras feras já quiseram me devorar, quantos bandidos já me assaltaram e quantos índios já quiseram tirar o meu escalpo desta cabeça-dura. De tudo isto, graças a Deus, até agora não me aconteceu nada. E eu só desejaria que vocês todos pudessem estar aqui e ver de perto a realidade. Vocês iriam ficar admirados. Eu mesmo não imaginava que isto fosse possível.

Minha viagem em si eu já lhes descrevi em parte. Mandei-lhes um cartão de Teneriffe e uma carta de Paranaguá. Por favor, confirmem sempre se vocês receberem toda a correspondência. Pois o correio daqui ainda é bem precário, e facilmente algo pode se perder.

Logo que eu pus os pés em terra, encontrei condições tão auspiciosas, que por ora não preciso pensar em outras viagens para o interior. Aqui tenho trabalho mais do que suficiente, de modo que já escrevi para outro Pastor. Tenho para atender agora cinco comunidades grandes, com 100 famílias cada e um número de 2.000 a 3.000 almas. E diariamente preciso lecionar para 50 crianças, e dar aulas de Ensino Confirmatório. Estas comunidades todas já estão bem organizadas. Todas têm igreja e casa pastoral própria. Elas remuneram os seus próprios pastores e os empregam. Estas comunidades ficaram vagas, porque o pastor que as servia até agora, o Pastor Rau, assumiu o cargo de diretor da escola na cidade de Joinville, que recebe um subsídio de 2.000 Marcos do imperador alemão. O Pastor Rau ficou muito feliz que eu cheguei no momento oportuno e pude assumir as comunidades dele. Eu naturalmente peguei esta oferta com as duas mãos e pensei: Por que ir para a mata virgem no interior, se aqui recebemos de mão beijada comunidades grandes e autônomas, já instaladas?! Como o Pastor Rau assume toda a responsabilidade por isto e as comunidades até agora ainda não dependem de nenhum sínodo, tenho esperança de assumir estes lugares também formalmente para a Caixa de Deus Luterana (Lutherischer Gotteskasten). Assim a nossa Igreja Luterana de imediato teria ganhado terreno seguro para sempre.

A cidade de Joinville, onde eu fiz a pregação no culto de Ano Novo, é uma verdadeira colônia alemã. Tão bonita como eu jamais vi antes. Por tudo se fala o alemão. Até os negros falam nossa língua, o que soa bem engraçado. Joinville também vai receber um Pastor que, segundo se diz, é luterano e pertence ao Ohio-Synod. Então, logo terei mais um colega!

Logo no dia seguinte à minha pregação (em Joinville) vieram dois integrantes do Presbitério de outra comunidade, da Estrada da Ilha, e me perguntaram se eu não gostaria de ir com eles para a sua comunidade. Depois de me informar detalhadamente sobre a situação da comunidade e não ver nada que me pudesse impedir, eu concordei com eles, sob a condição de que antes uma Assembleia regular da mesma aprovasse a minha ida.

O resultado tão favorável desta Assembleia eu já enviei no original ao querido tio. Eu estou muito curioso para saber o que será dito na Alemanha sobre este passo... Também os presbíteros das outras quatro comunidades solicitaram meus serviços. E eu as estou atendendo por enquanto, até que chegue auxílio da Alemanha.

Duas casas pastorais estão a meu dispor. Cada uma das comunidades me queria para si. E o mais bonito é que eu nem saí para a rua para procurar lugar. Eu estava sentado confortavelmente em meu hotel, desempacotei meus baús, pendurei minhas roupas no sol, escrevia meu relatório de viagem, etc. E então eles chegaram para me buscar com duas carroças, que carregaram todos os meus pertences. (Este aventureiro tem sorte, como veem!). No dia 15 de janeiro bem cedo as carroças já estavam lá, diante de meu hotel. Então eu empacotei minhas coisas rapidamente e fiz algumas compras. Logo comprei um cavalo de montaria, do Pastor Rau, por 200 Mil (reis?), e cela, pelegos, etc. por 100 Mil (reis?). Gosto muito do cavalo. Ele é ótimo para se montar e é bem manso. Também comprei talheres, louça, panelas e produtos alimentícios. Pois agora de novo preciso me virar sozinho em minha casa e bancar o solteiro. Lá no mato não existem hotéis.

Já havia escurecido quando chegamos ao nosso destino. Lá estava eu, em minha nova situação senhoril! Em primeiro lugar acendi a minha lâmpada, pois, para ser franco, eu estava com um pouco de medo, já que logo aos fundos da casa pastoral começa o mato. E a casa tinha estado desocupada há algum tempo.

Ah, eu ia esquecendo: Antes da minha partida de Joinville um brasileiro vendeu-me um animal que ele havia capturado no mato. Não consegui entender que animal é, mas tem vida, e eu queria algo vivo junto comigo na casa!

Quando iluminei a peça da casa em que eu estava, de imediato vi vida em abundância... Baratas para todo o lado! ...

Logo na 1ª. noite ainda inspecionei toda a casa; e ela me agradou muito. É grande e cômoda — em dois andares (aqui o autor descreve a casa em detalhes). Na frente da casa há um belo jardim, com árvores frutíferas: 12 cerejeiras, faias e laranjeiras, e uma cerca viva... As laranjeiras estão cheias de frutos... Bananas há durante o ano todo.

A dois mil passos atrás da casa começa o mato pastoral e 10 morgons de terra, que dizem ser a melhor da redondeza. Grama e capim crescem por toda a parte e durante o ano todo. Não se faz feno por aqui, porque não é necessário. A vegetação é extremamente exuberante...

Esta é, portanto, minha atual morada e seus arredores. Estou rodeado de moradores alemães. À noite durmo de janelas e portas abertas. Não há nenhum perigo.

A cada domingo eu prego em duas comunidades. Inicio pontualmente às 9h00. E as igrejas estão sempre bem cheias. Os pomeranos são pessoas muito igrejeiras. O povo é muito bom para comigo. E eles desejam que eu, mais tarde, quando não mais preciso viajar, fique com eles. Os membros das comunidades também me trazem muitos alimentos. Ontem, por exemplo, recebi três garrafas de leite, uma garrafa de vinho de laranja, duas dúzias de ovos e bananas. Pena que não consigo consumir tudo isso, e preciso jogar fora muita coisa que se deteriora.

A igreja foi inaugurada há quatro semanas e é toda de alvenaria. Todos os dias, das 7h00 às 11h00 dou aulas para 50 alunos — e, ao lado disso, ministro Ensino Confirmatório e celebro os eventos casuais, como batismos, casamentos, sepultamentos... Realmente tenho muito a fazer. Hoje me anunciaram um casamento e um sepultamento.

Aqui na região costeira, onde vivemos, o clima é tropical. Com exceção de trigo, tudo cresce. O produto principal é a cana-de-açúcar, que se colhe o ano todo. Além disso, produz-se arroz, milho, café, chá, laranja, limão, etc...

Em dezembro, quando cheguei, estava muito quente, pois era o começo do verão. Meu rosto doía nos primeiros dias como se estivesse queimado... Todos os dias as temperaturas chegam a 25 °R (= 31 °C), e à noite a temperatura cai para 20 °R (= 25 °C).... Gosto desse clima...

Para tua tranquilidade posso escrever-te que estou muito bem, graças a Deus. Eu me sinto como se já vivesse aqui há anos. E, no entanto, faz apenas umas

poucas semanas que cheguei...

Eu desejaria muito que você pudesse nos visitar aqui. Estou firmemente decidido a ficar e, a partir de agora, manter o meu acampamento fixo por aqui (na Estrada da Ilha)...

Estejam todos recomendados ao nosso Amado Pai Celeste e escrevam logo. Enviem jornais, isto é, aqueles em que talvez tenha saído o meu relatório de viagem.

Lembranças e um beijo.

Vosso grato filho e irmão.

Otto

Endereço: Rev. Otto Kuhr — Pastor Evangélico Luterano — Joinville, Santa Catharina — Brasil.


Tradução de P. Dr. Osmar Zizemer


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Autor(a): Otto Kuhr
Âmbito: IECLB / Organismo: Igreja Evangélica Luterana na Baviera - Alemanha
Título da publicação: Anuário Evangélico - 2014 / Editora: Editora Otto Kuhr / Ano: 2013
Natureza do Texto: Vários
Perfil do Texto: Carta
ID: 28448
Crer significa fixar o olhar firme e continuamente em Cristo.
Martim Lutero
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