Deus é «mão aberta»

07/04/2019

João 12.1-8
Deus é «mão aberta»

Prezada Comunidade
Estimado rádio -ouvintes da RádioWeb Luteranos UAI.
O profeta Isaías nos diz no capítulo 43.16-21, que Deus deve ser reconhecido pelas suas ações. A história é fundamental para a fé de Israel (Sl 78). Mas a história não deve ser idolatrada e nem devemos querer que ela se repita. Não devemos querer que Deus faça as mesmas coisas do passado ainda hoje. 

As ações de Deus não querem ficar no passado. Elas querem acontecer também hoje e no futuro. De maneira diferente. Por isso, a Palavra de Deus nos diz que o Deus que é capaz de secar um rio para que um povo passe, esse mesmo Deus também é capaz de encher de água um deserto para que o povo beba (Is 43).

As ações de Deus devem provocar gratidão em nossos corações, assim como provoca gratidão nos chacais e avestruzes do deserto, que encontraram água e rios em terra seca. Saber agradecer é necessário para aprender a confiar. Quem não sabe agradecer pelas coisas boas, também não saberá confiar nos momentos de dificuldade. Deus é aquele que fez, faz e fará. O passado nos deve ajudar a confiar na fidelidade de Deus. É isso que as ações de Deus nos querem ensinar. Podemos confiar na fidelidade de Deus também daqui para frente.

O Evangelho de João 12.1-8 nos fala de um acontecimento na vida de Jesus em que Judas ficou indignado. E será que Judas não tem razão? Ele reclama, protesta, contra um ato de desperdício sem igual, cometido diante de Jesus — um ato que até envolve a própria pessoa do Mestre.

Judas é tesoureiro dos discípulos. Ele precisa ver, dia por dia, como ajunta o dinheiro necessário para comprar comida. Ele é que sabe calcular! Por isso, não admira que tenha logo reparado naquele vidro de perfume de nardo, que Maria, irmã de Lázaro, levava nas mãos. Há uma fortuna naquele vidro. Vendido em casa especializada, esse vidro de perfume poderá render até trezentos denários. Trezentas moedas de prata! Cada moeda de prata representava o salário de um dia. Portanto, o que Maria tinha nas mãos era algo muito valioso, representava o salário de um ano inteiro de um trabalhador.

Por isso, para Judas, o que esta mulher fez, é uma loucura! Quebrar aquele vidro caríssimo, derramar aquele bálsamo precioso, aquele perfume estrangeiro, sobre os pés de Jesus, isso doía! São trezentas moedas de pratas jogadas fora. Judas se revolta. Ele resolve abrir a boca. Desta vez ele vai falar. É verdade, vai ser um escândalo, reclamar no meio do banquete que esta Maria, sua irmã Marta e seu irmão Lázaro estão dando para eles. Mas ele não pode ficar calado, E fala: «Por que não se vendeu este perfume por trezentos denários, e não se deu o dinheiro aos pobres?»

Vamos parar um pouco aqui!
Vamos ignorar que Judas é um discípulo que em seu coração já havia se afastado de Jesus. Vamos ignorar que ele não se preocupa pelos pobres, mas que se preocupa com a comissão que ele poderia ganhar ao vender aquele perfume. Vamos ouvir suas palavras como sendo uma pergunta séria, dirigida a nós, a nossa comunidade, a nossa igreja. Como é que nós lidamos com o nosso dinheiro e com o dinheiro para a igreja, com nossas contribuições para a igreja? Onde é que estão os pobres e a igreja nos nossos orçamentos? Não são levados em conta? Se isto for o caso, as palavras de Judas nos atingem, porque os pobres realmente deveriam ser uma preocupação para cada pessoa cristã e para a igreja Cristo. No Antigo Testamento, cada vez que um rei falava dos seus projetos econômicos, os profetas faziam a mesma pergunta: Onde dormirão os pobres nesse seu projeto? Assim, não vamos passar por cima daquilo que Judas diz, somente por ter sido Judas, que mais tarde traiu Jesus.

O engano de Judas foi supor que Jesus não se importava com os pobres. Judas considerava que ele era um advogado melhor para os necessitados. Achava que o que importava, era distribuir dinheiro entre os pobres. Que o principal problema do ser humano era mesmo o dinheiro. Que todo o mais se resolve no mercado. Hoje poderíamos dizer que melhorar de vida é importante, mas junto com isso também deve haver consciência social e política. Porque sem essa consciência social e política, sem saber de onde vem as coisas, as pessoas se tornam somente consumistas. A inclusão pelo consumo tem efeitos extraordinários – tem resultado a curto e médio prazo para resolver questões da pobreza, mas a longo prazo tem consequências diretas no tipo de cidadão que se forma.

A inclusão pelo consumo incentiva os valores neoliberais, destrói o meio-ambiente e torna as pessoas individualistas. Há um tempo atrás se podia comprar mais, de comida a refrigerador, mas quais são os valores que ficaram em nossa sociedade? Os preconceitos de classe, cor e orientação sexual nunca estiveram tão assumidos. E essa violência de tendência fascista – o ódio social – se espalha das elites às camadas mais populares.

Jesus diz: «Os pobres, sempre os tendes convosco.» -- Essas palavras não significam que Jesus não se importava com os pobres, ou com as necessidades materiais das pessoas. Ele quer dizer que os pobres sempre precisarão de nós, que sempre haverá problemas sociais, necessidades materiais e sociais. Até hoje nenhum projeto político e econômico conseguiu resolver todas dificuldades sociais.

Mas, prestemos um pouco mais de atenção no gesto de Maria. Gastar aquela fortuna num instante, em um gesto tão estranho, tão fora do comum! Derramar aquele perfume precioso, ungir os pés de Jesus, e depois enxugá-los usando como toalha os próprios cabelos! Será que isso foi um capricho momentâneo? Será que Maria ficou tão comovida, tão perturbada por dentro, que seu raciocínio ficou desligado? Será que ela não sabe o que faz?

É bem possível que Maria tenha sido uma pessoa angustiada. Talvez a única pessoa abalada em seu interior, entre todos os que cercavam Jesus nesta hora. Mas nós sentimos que esta comoção interna não foi nenhuma loucura leviana. Certamente foi uma loucura do coração, a loucura de um amor santo, de alguém que quer ser agradecida a Jesus pela importância que ele representou na sua vida e de sua família.

O rapaz que ganha o salário mínimo e que compra um buquê de rosas caras para sua namorada — ele entende um pouco deste sentimento de Maria. O casal do interior de Minas Gerais que fez um empréstimo, acima de suas capacidades, para poder levar o filho doente, de táxi, para o especialista aqui em Belo Horizonte— esse casal também entendeu qual é a real finalidade do dinheiro. Quem compra flores para colocá-las no altar da igreja — ou aquela pessoa que contribui financeiramente com generosidade com sua igreja – essa pessoa também faz isso por gratidão, por reconhecimento pela presença viva de Deus em sua vida.

Maria nos mostra que ela não faz nenhuma loucura, mas ela tem os olhos abertos pelo amor, pela gratidão. Ela quer ser agradecida a Jesus, enquanto Jesus ainda está fisicamente com eles. Ela antevê a morte de Jesus. É por isso que não pode reservar o perfume precioso para depois. Depois só poderia servir para embalsamar um corpo morto. Ela precisa derramar o perfume agora, enquanto o seu Senhor está com vida. É como se Maria nos quisesse lembrar: Não guardem as flores só para os túmulos das pessoas. Os vivos é que precisam delas. E precisam muito! Até Jesus precisou de sinais de amor, antes de enfrentar sua última luta, no caminho da obediência a Deus!

Enquanto isso, Marta está empenhada em servir a Jesus e seus discípulos, oferecendo-lhes um bom jantar. Um pouco antes desse jantar, Marta e Maria estavam chorando a morte de seu irmão Lázaro. Marta ao encontrar-se com Jesus antes de Jesus ressuscitar a Lázaro, faz uma belíssima confissão a Jesus: Eu creio que o senhor é o Messias, o Filho de Deus que deveria vir ao mundo (Jo 11.27). Maria aqui diz a mesma coisa, só que faz isso através de um gesto concreto. Ela agradece a Jesus com um gesto concreto. O que chama a atenção é que Judas, que viveu tão perto de Jesus, que testemunhou milagres, ouviu parábolas, vivenciou muitas situações – Judas não professou a sua fé nem com palavras, nem com ações. Judas representa assim a dureza de algumas pessoas que acham um desperdício gastar dinheiro em projetos sociais, com campanhas e ofertas para os pobres e ainda censuram quem contribui.

Vejam, Maria, com seu gesto fora do comum, agiu assim como Deus age conosco. Deus é um «mão aberta», ele é generoso. Deixa o sol brilhar e deixa a chuva cair sobre bons e maus, sobre justos e injustos. Deus nunca foi mesquinho. Ele «desperdiçou» o pão e os peixes, deu mais do que as pessoas podiam comer, desperdiçou seu perdão, gastou sua vida aceitando as pessoas que a sociedade e a religião não queriam.

Assim entendemos, porque Jesus diz a Judas: «Deixa-a. Entendei o que ela faz”. Jesus nos ensina que tem coisas na vida que tem muito valor, mas não tem preço. E Jesus aceita, com brandura, a oferta de Maria, porque prefere ter uma casa perfumada por gestos gratuitos de amor, do que uma casa empesteada de ódio e rancor. Jesus escolhe o aroma da delicadeza das pessoas que ainda são capazes de realizar gestos de amor e de gratidão.

Portanto, os dois textos bíblicos que ouvimos hoje nos querem dizer como cristãos e como igreja não devemos viver somente de lembranças sobre a ação de Deus no passado. Não devemos viver somente de memórias. A igreja é chamada por Jesus a viver ainda hoje em solidariedade, em serviço. E cada um de nós é chamado a viver e expressar sua gratidão a Deus em gestos concretos. Por isso, ao final dessa reflexão deveríamos nos perguntar: O que nós temos para oferecer a Jesus? Qual é o nosso gesto para demonstrar gratidão por tudo aquilo que Deus já tem feito por nós? Ou então: Com quem nós nos comparamos nessa passagem do Evangelho: Com Marta que por gratidão a jesus se dispõem a servir, com Maria que reverenciou a Jesus com um gesto de desprendimento e de amor, ou com Judas?

Perfumando a casa (Gerardo Oberman)
e toda a casa se encheu do aroma do perfume... (João 12:3 B)

Existem pessoas que, com a sua simples presença,
Perfumam os espaços que visitam.
Perfumam com suas palavras e até com seus silêncios,
Perfumam quando sorriem e também quando choram,
Perfumam ao entrar e deixam generoso perfume ao sair,
Porque eles não guardam o perfume, com vaidoso egoísmo, somente para si.
Essas pessoas são uma bênção,
São um precioso presente de Deus.
Para perfumar os lugares que cheiram a fechado,
Os lugares onde já ninguém perfuma,
Os espaços que foram esvaziados.
De qualquer fragrância de vida,
de sonhos, de esperança, de solidariedade,
de sensação de harmonia e de paz,
de buscas sinceras de justiça,
De plenitude, de equidade, de compartilhar.

Existem pessoas que esbanjam perfumes,
Cujos aromas nutrem o tempo e as esperas,
Acendem os diálogos e os olhares,
Apaixonam pelas ações e pelas pausas,
Colocam sentido onde havia confusão,
Um pouco de luz em lugares escuros,
Calor onde tudo estava muito frio.

Existem mulheres e homens
Que não ficam para si com o que lhes foi dado,
entendem que aquilo que possuem é somente por graça:
O perfume de suas vidas boas e consagradas,
Vidas preciosas que se derramam.
No serviço, na ação profética,
No gesto humilde que comove.
Vidas que se jogam e suportam a crítica
De quem nada perfuma.
Vidas que se tornam vítimas
Das hipocrisias malcheirosas,
Dos medíocres de sempre,
Que estão podres de inveja e de um ódio que cheira mal.

Graças a Deus existem vidas que deixam o seu agradável aroma
Por onde quer que passem e onde quer que estejam.
Obrigado por essas vidas,
Pelos seus aromas perfumados de plenitude
E que perfumam o cotidiano viver
Em um tempo de tanto cheiro de morte!

Que a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus nosso Pai e a comunhão do Espírito Santo estejam no meio de nós. Amém.

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